terça-feira, 28 de outubro de 2008


Vale do Baixo Sabor. Aqui estão assinaladas as ribeiras(os) mais importantes. A verde, aqueles que poderão apresentar gravuras rupestres. A vermelho, os ribeiros onde já foram identificadas gravuras e a azul é onde está a ser construída a barragem.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Barragem do Baixo Sabor

Num blog intitulado de "Arqueologia", porquê falar sobre a barragem do Baixo Sabor? Bem, na realidade, faz todo o sentido. Parece que este rio já foi prospectado por empresas de arqueologia e até se encontraram uns "sitiozitos" arqueológicos. Se bem me lembro a coisa há-de andar pelos 191, mais coisa menos coisa. Antes de avançar com este tema, é preferível situarmo-nos geograficamente e aprofundar um pouco alguns aspectos relevantes, isto para que não haja confusões. O rio Sabor nasce na serra da Parada (Espanha) a uma altitude de 1600 metros e penetra em Portugal através da serra de Montesinho e a sensivelmente 120 Km, desagua no rio Douro à cota de 97 metros. Portanto, percorre todo o distrito de Bragança (Trás-os-Montes) sentido NE - SW. Em relação às barragens, existe uma mini-hídrica num dos seus afluentes, mais precisamente na ribeira das Andorinhas. É certo que este rio é considerado um rio selvagem, apesar de nele haver perturbação humana, mas onde é que não a há? De facto o Homem, está em todo o lado e raros são os sítios em que este não esteve. Não estiveram lá directamente, mas a acção humana também aí é visível através da poluição, por exemplo. No entanto podemos ver como seria a composição vegetal e animal antes da acção destrutiva do Homem. Se algumas zonas são fortemente agricultáveis (dentro dos possíveis), noutras, o ser humano não o fez e aí estamos a falar de algo natural. Certamente já ouviram falar em biodiversidade e a este respeito, Portugal está incluído numa das 25 áreas onde a eficaz conservação do seu património natural é essencial para preservar a biodiversidade do planeta. Em relação à diversidade de habitats e de espécies vegetais e animais que ocorrem no vale do Baixo Sabor, é importante e apresenta 17 tipos diferentes de habitats naturais. A geomorfologia da região de Trás-os-Montes é constituída, basicamente, por um extenso planalto (e algumas serras) acima dos 600 metros, pertencente à meseta ibérica, cortada apenas pontualmente pelos rios Douro, Sabor e seus afluentes, onde a altitude desce abaixo dos 300 metros. Este facto permitiu o refúgio de um numeroso grupo de plantas e animais, nestes vales, durante sucessivas épocas glaciares. Contudo, esta flora e vegetação particular foi sendo irradicada do vale do Douro devido à construção do sistema hidroeléctrico deste rio. Assim, o vale do Sabor suporta actualmente um grande número de espécies de plantas. Também o homem aproveitou, desde cedo, as condições particulares deste vale, como o demonstram as diversas gravuras rupestres encontradas no Baixo Sabor, datadas do período Paleolítico. A povoação de Cilhades possui marcas de ocupação que remontam à Idade do Ferro e surgem, ao longo do vale, vários vestígios de romanização e medievais. Encontram-se, ainda, alguns marcos históricos da capacidade do povo local de transpor este rio, que apresenta condições torrenciais durante alguns períodos do Inverno, como as Pontes de Remondes e da Portela, notáveis edificações que datam do século XVII. Nas encostas deste vale encontram-se, actualmente, vastas áreas de culturas de olival e amendoal (cerca de 840 hectares só no Baixo Sabor). Assim, a valorização de alguns produtos agrícolas de qualidade poderia juntar-se à crescente valorização e procura do património natural, paisagístico e cultural, permitindo encarar o vale do Sabor numa perspectiva realista de desenvolvimento sustentável. A sua localização próxima do Parque Natural do Douro Internacional e do Parque Arqueológico do Côa poderia ser aproveitada para o desenvolvimento articulado da região baseado no seu património natural e cultural único. Saliente-se que o III Quadro Comunitário de Apoio que prevê a atribuição de fundos específicos para apoio, nomeadamente em locais de comprovado interesse ambiental, a medidas agro-ambientais e ao Turismo no Espaço Rural, que poderão desempenhar um papel fundamental para a fixação das populações locais. Apesar disso, a atitude dos autarcas locais sobre este problema tem sido lamentável, apostando claramente na desinformação da população. Defendem o turismo associado à barragem, quando as grandes alterações do nível da albufeira e as limitações inerentes ao estatuto de ZPE da área impedirão o seu uso recreativo. Propõem a criação de um Parque Natural no Sabor com base na construção da barragem, que irradicaria a maior parte dos seus valores naturais, quando deveriam defender a constituição desse mesmo Parque sem este empreendimento. Defendem o progresso associado à barragem, quando têm na região inúmeros exemplos de barragens que não trouxeram qualquer desenvolvimento, com povoações em desertificação (veja-se, por exemplo, o caso do Pocinho). Dizem que nunca o Baixo Sabor foi considerado importante pela comunidade científica, quando foi a própria Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, paradigma do desenvolvimento da região, que elaborou o estudo da zona e sugeriu a sua inclusão na Rede Natura 2000. Afirmam que o EIA nunca foi contestado, quando vários pareceres negativos foram entregues durante o período de consulta pública do documento. Falam nas vantagens da criação da reserva de água desta albufeira para fazer face a condições de seca e criar condições de regadio na região, quando o uso desta reserva de água se limitará à produção de energia e se encontram já projectadas duas pequenas barragens para a irrigação do Vale da Vilariça. Segundo o EIA, importância energética da barragem do Baixo Sabor é "insignificante a nível nacional". Através do Protocolo de Quioto, Portugal, no quadro da partilha de emissões de gases de efeito de estufa ao nível da Comunidade Europeia, tem direito a uma quota de aumento de 27% das emissões de CO2 equivalente entre 1990 e 2010. De acordo com os estudos desenvolvido pelo Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa para o Ministério do Ambiente, se não forem tomadas medidas contrárias, o aumento previsto de emissões de gases com efeito de estufa entre 1990 e 2010 será de 53%. Aquilo que está em causa no Vale do Sabor é a preservação da história e património natural de Portugal e, de certa forma, do nosso planeta. O Vale do Sabor guarda vestígios únicos da memória da evolução da vida na Península Ibérica e desempenha um papel importante para a manutenção da biodiversidade. Cabe-nos, agora, a tarefa de compreender a lição natural que este vale encerra e unir esforços no sentido de conseguir preservá-lo isento de barragens, valorizá-lo, divulgá-lo e utilizá-lo numa óptica de desenvolvimento integrado e sustentado da região. Muito sinceramente, os transmontanos não têm culpa que Lisboa e Porto estejam a crescer e que, deste modo, seja necessária mais energia. Há quem defenda a construção da barragem do Baixo Sabor e há quem não esteja de acordo. Na realidade as pessoas que defendem esta obra não deviam opinar da forma como o fazem porque nunca visitaram o Baixo Sabor e, na pior das hipóteses, nunca estiveram em Trás-os-Montes. Penso que com este texto já se ficou a conhecer melhor este rio e até a região. No texto seguinte falarei de questões que, do meu ponto de vista, serão interessantes aqui abordar.